quinta-feira, 10 de julho de 2014

É apenas mais um fim do mundo diário e constante

 - Nossa! 7 x 1 para a Alemanha!

 - Pois é. Mas não é o fim do mundo...

 - Não pra todo mundo. Mas você viu a quantidade de gente chorando, queimando bandeira, ônibus e destruindo vitrines por aí?

 - Mas isso, pelo menos de acordo com o modo que vivemos hoje, é inevitável. Se não é algo proposital, no mínimo é um ônus calculado. Nós temos inúmeros estímulos diários que nos mostram uma realidade onde podemos tudo. Basta acreditar em si mesmo, ou ter fé em Deus, ou um dos mais eficientes: basta não desistir nunca. Aí, quando nem reza braba resolve as pessoas se revoltam. Mas é por um tempo determinado, e no fim, tudo volta como era antes: todos achando que faltou um pouquinho mais de fé ou um pouquinho mais de perseverança.

 Parece que ninguém entende que algumas vezes só "não dá". E todo mundo consegue enxergar o problema quando é com outro, mas, consigo mesmo, aí é diferente, porque com você mesmo a coisa sempre é diferente.

 Essa história de "sou brasileiro e não desisto nunca" parece uma enorme babaquice mas, algumas vezes, até parece que faz algum sentido - parece; ou talvez todos sejam assim, mesmo - não apenas os brasileiros. Tipo, você não tem grana nem pra comida e aluguel do mês, direito, e ainda assim vai e financia um carro zero. E não pode ser qualquer carro zero: não pode ser 1.0, tem que ter 4 portas, ar-condicionado, equipamento de som profissional...

 Você sabe (ou não) que tem certas limitações intelectuais, que mal consegue passar em um vestibular de qualquer universidade particular, de qualidade duvidosa, porque você zera a prova, mas insiste em pagar cursinho atrás de cursinho para passar em concursos públicos onde há uma vaga para 100.000 mil inscritos.

 O cara sabe que a beleza não é uma de suas melhores qualidades, tão pouco é esperto e sua "lábia" mal consegue manter a atenção de sua própria mãe sobre ele por mais de alguns segundos. Ainda assim a pessoa insiste em ir à balada e tentar alguma coisa apenas com  a mulher (ou homem) mais top do lugar - que até acha a situação engraçada porque não consegue ter certeza se aquilo é sério ou alguma pegadinha.

 Você, lá no fundo, sente sua insuficiência, sabe que não é bom o bastante - e que ao que tudo indica nunca será - mas alguma coisa te move em direção ao precipício que apenas você não vê. Todos ao seu redor estão vendo claramente o tamanho da sua ilusão, mas você ouve "sim" onde foi dito "não", um "talvez" onde foi dito "jamais", um "com certeza" onde foi dito "nem que o mundo acabe amanhã".

 Talvez grande parte da culpa dessa história diária e triste seja das exceções que surgem , aparentemente, a todo momento, até que parecem comuns o suficientes para que nos acostumemos com a ideia de que poderíamos ser nós mesmos: O homem do interior que apostou 1 bilhete da loteria e ficou milionário, o  jovem com obesidade mórbida e sem um tostão no bolso que namora uma modelo maravilhosa, o morador de rua que conseguiu terminar uma graduação - enquanto ainda morava nas ruas - e hoje tem um importante cargo executivo em uma importante empresa.

 Isso pode até soar como teoria da conspiração, mas é muito mais fácil controlar um povo esperançoso do que um revoltado por ser cônscio de sua realidade - ainda mais se pensarmos em um povo revoltado e ignorante. Então, pode ser que as coisas não nos pareçam assim simplesmente porque isso faz parte da condição humana, pode ser que isso seja intencional, mais uma forma de controle. E para esse controle  funcionar basta fazer com que nos questionemos: "por que não eu?"

  - Mas aí você faz o quê?

 - Nada. Não sou tão pretensioso à ponto de imaginar ter uma solução real para a Vida. E também tenho minha boa parcela de esperança, meu auto-boicote de realidade diário, a sensação de que amanhã vai ser o meu dia de ganhar na loteria com um único bilhete, mesmo sentindo lá no fundo, que por algum motivo que obviamente não faço a mínima ideia qual é, sou insuficiente.

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