terça-feira, 10 de dezembro de 2013

Egito, Êxodo e Deus: Parte II b: A Morada de “Deus”

 Esta é uma pequena série de textos mostrando uma alternativa ao ponto de vista consensual sobre o êxodo do Egito, o Egito e regiões próximas nessa época e a formação da religião judaica, que por sua vez deu origem ao cristianismo e ao islamismo. Os textos estão divididos em duas partes. Esta segunda parte é dividida em seis partes menores.
 Estes textos são uma espécie de resumo, trechos retirados do livro “TUTANCÂMON a verdade por trás do maior mistério da arqueologia” (título original: Mercy), de Andrew Collins e Chris Ogilvie-Herald, Editora Landscape, 2004. O livro é muito mais abrangente e detalhado do que o mostrado aqui, com inúmeras referências e pontos de vista alternativos sobre os temas abordados. Nesse resumo suprimi as referências e adotei os pontos de vista escolhidos como mais prováveis e necessários para o desenvolvimento do raciocínio dos autores. Quaisquer dúvidas ou pedidos de referências podem comentar que responderei.
 Estes textos, obviamente, estão aquém do original, no entanto, conseguem mostrar satisfatoriamente que o que sabemos talvez não seja exatamente da forma que pensamos ser. Para todos que se interessam pelo Egito, religiões, História e pela incessante busca pela verdade.

 Parte II b: A Morada de “Deus”:

 Eu Sou Yahweh

 Yahweh, o tetragramaton, ou nome inefável de Deus, foi revelado pela primeira vez a Moisés, em Madiã, na terra dos madianitas, que a muito se sabe situar-se no norte da Arábia. Um dia, enquanto cuidava do rebanho de Jetro, seu sogro, ele foi “além do deserto” e chegou à “montanha de Deus, o monte Horeb”, que significa “Montanha do deserto”. Ali, viu o “anjo do senhor”, sob a forma de um arbusto ardendo em chamas que, no entanto, não o consumiam, e durante o encontro, perguntou à deidade qual era o seu nome, obtendo como resposta: “EU SOU AQUELE QUE SOU”, e ele disse “Assim deves dizer aos filhos de Israel, ´Yahweh, o deus de seus antepassados, falou comigo, o Deus de Abraão, Isaac e Jacó”. Esse trecho do livro do Êxodo constitui a primeira revelação do nome Yahweh, ligando-o diretamente à montanha de Deus.

 Durante esse encontro com Yahweh, Moisés recebe a incumbência de voltar ao Egito, onde deve exigir do faraó que liberte a nação israelita. Mas isso simplesmente incita o faraó a causar ainda mais sofrimentos aos hebreus, e então Yahweh envia nova mensagem, na qual proclama:

Eu sou Javé [ou seja, Yahweh], e apareci a Abraão, a Isaac e a Jacó como Deus Todo- Poderoso [El shaddai], mas não lhes dei a conhecer meu nome, Javé [ou Jeová, ou Yahweh].

 Essa declaração é importante, pois confirma a nós que, antes da primeira visita de Moisés “à montanha de Deus, ou Horeb”, o verdadeiro nome da deidade era desconhecido para ele. Antes, o deus dos israelitas era conhecido como epítetos como Adon (“senhor”), ou variações de El, o nome cananeu de Deus, como El shaddai, “Deus Todo-Poderoso” ou “El-elohe-Israel, “o poderoso, Deus de Israel”. A adoração a Deus por parte dos israelitas estava intimamente associada à Montanha de Deus conforme se deduz do “Cântico do Mar”, poema do livro do Êxodo, que comemora a libertação de Israel do exército do faraó. Nele, lemos:

Tu o conduzes e o plantas sobre o monte da tua herança,
O lugar em que fizeste teu trono, ó Javé,
No santuário que tuas mãos prepararam.

 Yahweh foi assim considerado o habitante por excelência da montanha, ou pelo menos de um santuário ou altar que se considerou ter sido erigido por ele mesmo (inferência talvez de que ninguém sabia qual sua fundação original, mostrando assim que sua origem seria divina).


 Monte Sinai

 Seguindo o Êxodo, depois que o povo saiu do Egito, o livro do Êxodo nos conta que Moisés voltou à Montanha Sagrada de Yahweh na companhia dos “filhos de Israel”. Dessa vez o local é introduzido inicialmente como “Monte Sinai”, muito embora o nome “monte Horeb” seja mais adiante usado na narrativa, demonstrando que são um e o mesmo lugar. Ali Deus revelou a Moisés as leis sagrada, que estavam inscritas em “duas tábuas da aliança, contendo os mandamentos divinos”.

 A procura pelo monte Horeb, ou monte Sinai, é extremamente antiga. Depois de acamparem ali por um ano, no início dos 40 anos dos israelitas no deserto, a bíblia não fala mais na montanha de Yahweh. Aliás, os israelitas, e os judeus, depois deles, parecem ignorar completamente a área, o que parece estranho, dado que foi ali que as leis divinas foram entregues a Moisés pelo próprio Deus. A única pessoa que se disse ter subido ao “monte Horeb, de Deus” depois dessa época foi o profeta Elias. Ali ele permaneceu em uma gruta durante 40 dias e 40 noites.


 Jebel Mûsa

 Existe uma longa tradição que liga Jebel Serbal com o lugar do Monte Sinai, que parece ser mais antiga ainda que a ligada a Jebel Mûsa. Porém, mesmo sendo antiga, essa tradição data apenas do final do período romano. Além do mais, há bons motivos para se presumir que algumas das lendas ligadas a Jebel Mûsa eram originalmente associadas a Jebel Serbal, que parece ter sido o local original de peregrinação durante os primeiros tempos cristãos. Alheios a esse conhecimento, cristãos e muçulmanos vêm de todo o mundo visitar Jebel Mûsa e orar no local onde Moisés recebeu as tábulas da Lei e o cavalo de Maomé, Boraq, supostamente subiu ao céu. O monte Sinai original não podia estar situado ao sul do Sinai por diversos motivos.


 A fuga do Egito

 Devemos presumir que o ponto de partida do êxodo foi, como faz crer o velho testamento, Ramsés, a antiga Pi-Ramese, moderna Tell-el-Dab`a, e seus arredores, a residência original dos reis da linhagem de Ramsés no Delta Oriental. Ali também era a terra de Goshen, e mesmo a cidade de Zoan, onde os hebreus moraram na época de José e Jacó. Além disso, sabemos que Tell ed-Dab`a era a capital dos hicsos, Avaris, que supostamente tornou-se residência dos “leprosos” e “impuros” sob a liderança de Osasirph-Moisés e dos “pastores”, antes de sua expulsão do Egito.

 No livro do Êxodo, diz-se que os israelitas viajaram de Rameses para Succot, a Tjekku egípcia, hoje em dia Tell el-Maskhuta, descansando diante do lago Timsah, no extremo leste do Wadi Tumilat, um leito de rio seco que vai de leste a oeste, o qual devem ter atravessado para atingir essa área. Essa conclusão faz sentido do ponto de vista do relato bíblico, que declara que, depois que o faraó “deixou o povo partir”,

[…] Deus os levou, não pelo caminho dos filisteus [da Palestina], que é o mais curto; mas achou que, diante da guerra, o povo poderia se arrepender e voltar para o Egito.


 O Itinerário do Êxodo

 Viajando para o sul, a partir do lago Timsah, passando pelos chamados Lagos Amargos, eles poderiam ter atingido a entrada do Golfo de Suez e continuando ao longo de sua margem leste até atingirem a península do Sinai. Só que ficavam ali as minas de cobre e turquesa tão preciosas para os egípcios e, portanto, toda a região estaria repleta de soldados, que os israelitas, uma vez mais, não queriam enfrentar. Muito mais provável é que o caminho do êxodo tenha sido do lago Timsah até os Lagos Amargos, os Marah bíblicos, que significa “amargo”, bem como o mais provável a yam-sûp, ou “mar dos juncos”, onde os israelitas conseguiram despistar o exército egípcio que os perseguia, liderado pelo próprio faraó. Uma vez em sua margem oriental, eles teriam viajado para leste, “para o deserto de shur”, ainda hoje conhecido como o caminho de shur. Dali eles podiam ter tomado a estrada antiga utilizada desde tempos imemoriais por comerciantes em caravanas e pastores nômades, tais como os shasu, deslocando-se entre o Egito e a Arábia. Seguindo essa estrada na direção sudeste, eles podiam ter viajado sem obstáculos, passando pelas cidades que hoje são Nakhel e Et-Tamad, até que a Bíblia nos diz que eles chegaram a “Elim, onde havia doze fontes de água e setenta palmeiras, e acamparam junto às águas”.

 Embora alguns estudiosos da Bíblia coloquem Elim nas praias do Golfo de Suez, todas as indicações levam a crer que ficavam no Golfo de Aqaba, onde hoje encontra-se a estância hidromineral de Eilat, no Mar Vermelho. A palavra Elim é plural de El, que também se pode grafar Elat ou Elot, um lugar que o primeiro livros dos Reis, na Bíblia, nos diz que ficava “ao lado” de Ezion-Geber, onde a marinha de Salomão estava ancorada “na praia do Mar Vermelho, na terra de Edom”. Assim, Elot e Elim quase certamente são uma e a mesma coisa. Essa é a rota mais óbvia que Moisés e seus seguidores podem ter tomado, uma vez que pode ter sido essa mesma estrada que ele seguiu no caminho para a terra de Madiã e quando foi de lá para o Egito, sendo Madiã a terra que fica além das praias orientais do Golfo de Aqaba, às margens do qual se situava a Montanha de Yahweh.

 Depois de acamparem à beira das águas de Elim, o livro do êxodo nos diz que os israelitas retomaram a jornada e, no 15º dia do segundo mês depois de partirem do Egito, entraram “no deserto de Sin, que fica entre Elim e Sinai”. Depois de armarem suas tendas em um lugar chamado Rafidim, reclamaram de falta de água. Por isso diz-se que Moisés bateu com a vara na “rocha de Horeb”, da qual imediatamente fez jorrar água. Assim eles haviam atingido o Monte Horeb, a Montanha de Yahweh.

 Assim, seria o “deserto de Sin” o mesmo que “deserto do Sinai”, e por que eles pareceram ter atingido o Horeb, antes de partir outra vez e depois “chegarem ao monte” de novo? As respostas geográficas ficarão claras, mas é importante lembrar que há muitas incoerências, anacronismos e contradições no Pentateuco, o que indica que foi composto por diferentes autores, de diferentes formações, em épocas distintas.


 Defesa da Tese do Monte Seir

 Nem o livro do Êxodo, nem o livro dos números deixam claro onde ficava o deserto de Sin, ou do Sinai. A ligação entre o Sinai bíblico e o que conhecemos hoje como Península do Sinai foi estabelecida apenas na era cristã. O mais provável é que o monte Sinai, ou Horeb, ficasse em algum ponto além de Eilat, na entrada do Golfo de Aqaba, onde o maciço montanhoso de Seir, a terra dos shasu, estende-se na direção do Mar Morto.

 O poema de guerra conhecido como “cântico de Débora”, encontrado no livro dos juízes, proclama:

Eu vou cantar louvores ao senhor, Deus de Israel.
Senhor, quando saíste de Seir,
Avançando dos campos de Edom,
A terra tremia, o céu ribombava
E as nuvens se desfaziam em água.
Os montes se agitavam diante do Senhor, que vem do Sinai,
Diante do Senhor, o Deus de Israel.

 Se esse poema não se refere simplesmente ao ataque final sobre Canaã lançado pelos israelitas a partir do Seir, então ele se torna o lugar por excelência associado ao poder de Yahweh. Mais que isso, insinua que Sinai é apenas outro nome de Seir. Então, o que sabemos exatamente sobre Seir ou Edom, a terra dos shasu? Inscrições de textos egípcios conectam os shasu especificamente com o monte Seir, o principal cume da cadeia de Seir, e com Edom.


Parte II a: As primeiras tribos adoradoras de “Deus”  
Parte II-c: Construindo Deus  

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